Presente no aniversário de Anne onde a menina ganhou seu famoso diário, Nannete também foi enviada para Bergen-Belsen, mas teve um destino diferente
Era 12 de junho de 1942. Anne Frank celebrava seu 13º aniversário quando ganhou um presente que mudaria sua vida: um diário com capa de pano xadrez; dado por seu pai, OttoFrank.
Mas aquele não foi o único mimo recebido pela menina judia. Nanette Blitz Konig, sua amiga de mesma idade, lhe deu um um singelo broche, mas que Anne guardou com muito carinho. As meninas haviam se conhecido no Liceu Judaico, em Amsterdã, e logo se tornaram 'inseparáveis'.
É bem verdade que a vida não era tão fácil naquela época. Nem mesmo para meninas de sua idade. Afinal, dois anos antes, em 10 de maio de 1940, as tropas nazistas de Adolf Hitler haviam invadido o país. A perseguição contra os judeus começava na nação que mais vitimou pessoas judias na Europa Ocidental.
Por conta disso, a festa precisou terminar cedo, visto que a Holanda vivia sob um toque de recolher determinando que às 20 horas todos tinham que estar em suas respectivas casas. Ainda assim, o dia era especial. Anne e seus amigos assistiram filmes, fizeram um lanche e, é claro, se divertiram; assim como toda criança deveria fazer.
Antes de viver a perseguição, Nanette se recorda que era uma criança como qualquer outra, gostava de subir em telhados, comer as maçãs do vizinho e andar de bicicleta. "Era levada da breca", descreve em sua autobiografia, 'Eu Sobrevivi ao Holocausto', publicada em 2015.
Mas depois da invasão, teve de passar a viver ostentando uma estrela de Davi amarela em sua roupa. Além disso, Nanette também foi privada de direitos básicos, como ir ao cinema, andar de ônibus e tantos outros.
Lembro para viver porque esquecer é morrer", reforça na introdução de sua história.
Quando soldados nazistas bateram na porta da casa da família, em setembro de 1943, não restou outra opção a não ser se entregar. Apressando-os, os guardas exigiram que eles se vestissem o mais rápido possível e levassem apenas objetos essenciais.
Nanette, sua mãe (Helene), seu pai (Martijn) e seu irmão mais velho (Bernard) foram alocados num bonde e transportados para a estação de trem de Amstel. De lá, seguiram até o campo de concentração de Westerbork — onde os judeus holandeses eram levados antes de serem destinados aos campos de extermínio. A família foi separada entre os alojamentos masculinos e femininos.
A permanência em Westerbork durou até 15 de fevereiro de 1945, quando os quatro foram transferidos para Bergen-Belsen, na Alemanha. Conforme Nanette aponta em seu livro, os soldados nazistas que escoltavam o trem tinham um "olhar sombrio" e "aparência carrancuda".
Mas a família de amiga de Anne teve um tratamento diferente dos demais ao chegar por lá: eles não precisaram ter o cabelo raspado, nem tiveram números tatuados em seu corpo; embora ainda precisassem se alimentar da mesma 'comida' — se é que poderia se chamar assim — servida a todos os prisioneiros de lá.
A explicação era simples, recorda matéria do DW, como o pai de Nanette trabalhava em um banco, ele e sua família foram colocados na chamada "lista Palestina" — das pessoas que poderiam ser trocadas por prisioneiros de guerra alemães.
As condições insalubres do campo deixaram marcas na família de Nanette: com Martijn morrendo de infarto em novembro de 1944. Pouco depois, ela ficou sozinha por lá após suas mãe e irmão serem transferidos — e nunca mais vistos.
A solidão de Nanette durou até janeiro de 1945, quando Bergen-Belsen recebeu Anne Frank e sua irmã Margot, que haviam sido transferidas de Auschwitz — mas que morreriam apenas algumas semanas depois.
As duas estavam com os cabelos raspados e tremiam de frio, apesar de enroladas em um cobertor. As amigas, ao se encontrarem, se abraçaram e desabaram em lágrimas. "Éramos dois esqueletos", recorda Nenette em sua biografia.
Anne ainda lhe confidenciou que sua família não fugiu para a Suíça, como ela esperava, mas que permaneceram escondidos no chamado 'Anexo Secreto', na fábrica de Otto, na famosa rua Prinsengracht 263.
As tropas britânicas libertaram o local em 12 de abril de 1945, poucos dias após a morte de Anne Frank, em algum momento de março daquele ano, quando tinha apenas 15 anos.
Os sobreviventes de Bergen-Belsen estavam num nível tão crucial de desnutrição que muitos morreram por comer mais do que seus corpos suportavam. Nanette, que tinha apenas 16 anos, pesava somente 31 quilos.
Após a libertação de Bergen-Belsen, Nanette voltou à Holanda e passou três anos no sanatório de Santpoort; onde descobriu o destino de seus demais familiares: sua mãe morreu em um campo de carga à caminho da Suécia, em 10 de abril; enquanto seu irmão, provavelmente, foi fuzilado enquanto era transferido do campo. Seu corpo jamais foi encontrado. Ainda no sanatório, Nanette recebeu a visita de Otto Frank e soube sobre suas pretensões de publicar o diário.
Nanette deixou a Holanda e se mudou para a Inglaterra, onde foi viver com uma tia por parte de mãe, em Londres. Na capital inglesa, trabalhou como secretária e conheceu seu marido: o húngaro John Frederick Konig.
Eles se casaram em julho de 1953 e logo depois se mudaram para o Brasil. Por aqui, tiveram três filhos: Elizabeth (hoje com 70 anos e morando nos EUA), Judith (67, Canadá) e Martin (62, São Paulo). Atualmente ela tem 96 anos.